
A fatalidade de Lourivaldo Ferreira Silva Nepomuceno, na terça-feira (6), aumentou as incertezas em relação ao sistema desenvolvido justamente para proteger contra colisões.
Espaço entre as portas da Linha 5-Lilás
O Ministério Público de Defesa do Consumidor de São Paulo instaurou inquérito nesta quarta-feira (7) para apurar o acidente que vitimou um passageiro após ficar preso entre o vão e a porta da plataforma da Estação Campo Limpo, da Linha 5-Lilás, atendida pela ViaMobilidade.
Diferentemente do Metrô estadual, os terminais sob controle da concessionária não possuem sensores de presença, que impedem o esmagamento, na área onde o alvo ficou preso.
No documento, o Ministério Público afirma que o acidente “indica a presença de falha significativa de segurança” e, por isso, “é necessária a verificação dos dispositivos de segurança empregados na Linha 5 Lilás, a fim de resguardar a integridade física e a vida dos usuários”.
A MP concede à Secretaria de Estado dos Transportes Metropolitanos e à concessionária ViaMobilidade o prazo de cinco dias corridos para se manifestarem, caso queiram interpor recurso.
➡ Exige ainda que o governo estadual, no prazo de dez dias corridos, encaminhe cópia do contrato de concessão e informe as etapas de segurança para embarque e desembarque de passageiros, incluindo os procedimentos para monitorar as práticas adotadas pela empresa. O Ministério Público pede que o governo demonstre as causas que levaram à morte do passageiro.
➡ A MP também concede à ViaMobilidade o mesmo prazo para fornecer cópia de sua legislação atualizada,relatar as providências adotadas pela concessionária para o embarque e desembarque sem riscos de passageiros na Linha 6-Lilás e se há falhas no terminal Campo Limpo, onde ocorreu o acidente.
➡ O MP também solicita à Empresa Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) que explique os dispositivos do contrato de cessão relativos à segurança dos passageiros que não estão sendo observados pela concessionária.
O inquérito foi aberto pelo Promotor de Justiça do Consumidor da 3ª Vara do Consumidor, Denilson de Souza Freitas, após uma provocação do deputado Guilherme Cortez (PSOL).
Filho de um pedreiro, um estagiário de atletismo e um repositor de supermercado, Lourivaldo Ferreira Silva Nepomuceno, 35, morava em Taboão da Serra, na Grande São Paulo, era casado e tinha três filhos.
Sua morte levantou uma série de questionamentos sobre as portas automáticas, os sensores de presença que protegem contra esmagamento e os procedimentos que serão adotados pela concessionária para aumentar a segurança dos visitantes.
Em nota, o governo estadual informou que “acompanhará a situação perante o Tribunal de Contas do Estado (TCE) e o Ministério Público. A avaliação das concessionárias é periódica e realizada pela Artesp. Quando constatadas falhas ou violações contratuais, processos administrativos são instaurados e as devidas autorizações são aplicadas”.
A ViaMobilidade também afirmou em nota que “se coloca à disposição do TCE e do Ministério Público e prestará todos os esclarecimentos”.
Abaixo, veja perguntas e respostas sobre as portas automáticas e sensores no metrô de São Paulo.
O que são portas automáticas de plataforma? 1 de 4 Movimentação no momento do acidente na Linha 5-Lilás– Foto: Reprodução/TV Globo
Atividade no momento do acidente na Linha 5-Lilás– Foto: Reprodução/TV Globo
As portas automáticas das plataformas e vagões dos trens são automatizadas. Elas abrem e fecham em sincronia com as portas do trem, oferecendo segurança e organização no embarque e desembarque dos passageiros. Elas protegem e bloqueiam, por exemplo, o acesso aos trilhos e evitam que pessoas e objetos caiam.
Antes do fechamento das portas, há um aviso sonoro. A porta do sistema e a porta do trem devem ter sensores de segurança que detectem se elas foram fechadas corretamente ou se há algo ou pessoa bloqueando o fechamento ou entre elas, como a que causou a fatalidade de Lourivaldo.
Quando não fecham completamente, o sensor — quando presente — sinaliza, e as portas se abrem novamente, como se fossem uma porta de elevador. No caso do incidente de terça-feira (6), porém, segundo testemunhas, isso não ocorreu, e o trem adiantou sua viagem.
Todas as linhas de trem de São Paulo possuem portas de plataforma automatizadas? 2 de 4 Plataforma lotada na Linha 5 – Lilás — Imagem: Arquivo pessoal
Plataforma lotada na Linha 5 – Lavanda — Foto: Arquivo pessoal
Não. As portas de plataforma começaram a ser instaladas em São Paulo em 2010, na Linha 2-Verde. Hoje, 28 estações administradas pelo metrô do estado nas Linhas 1-Azul, 2-Verde, 3-Vermelha e 15-Prata possuem o equipamento em operação.
Em nota, a Prefeitura informou que continua ampliando a instalação desses equipamentos. As obras estão em andamento em quatro terminais (Sé, Santa Cecília, Marechal Deodoro e Tatuapé) e há mais 24 terminais com instalação programada, nas Linhas 1-Azul,2-Verde e 3-Vermelha. A previsão é de conclusão dessas obras até 2026.
Hoje, se somarmos a Linha 4-Amarela, da concessionária ViaQuatro, e a Linha 5-Lilás, da ViaMobilidade, ambas subsidiárias do Grupo CCR, 53 das 91 estações do Metrô de São Paulo possuem portas de plataforma automatizadas. O sistema foi implantado inicialmente na França há praticamente três décadas para diminuir acidentes e interrupções causados por usuários nos trilhos.
Quais linhas são operadas pelo governo federal de São Paulo e pelas concessionárias?
Linhas operadas pela prefeitura de São Paulo:
Linha 1-Azul: Jabaquara – Comitê Paralímpico Brasileiro – Tucuruvi. Linha 2-Verde: Vila Prudente – Vila Madalena. Linha 3-Vermelha: Corinthians-Itaquera – Palmeiras-Barra Funda. Linha 15-Prata (Monotrilho): Vila Prudente – Jardim Colonial.
Linhas operadas por concessionárias:
Linha 4-Amarela: Operada pela ViaQuatro, subsidiária do Grupo CCR. Linha 5-Lilás: Operada pela ViaMobilidade, também subsidiária do Grupo CCR.
Quais linhas possuem sensores de presença no vão entre o trem e a porta do sistema? 3 de 4 Sensor de presença instalado entre a porta do sistema e o trem– Imagem: Arquivo pessoal
Sensor de presença instalado entre a porta da plataforma e o trem– Foto: Arquivo pessoal
Linhas 3 e 1 da cidade.
Em nota, a Prefeitura especificou que todas as estações equipadas com portas do sistema na Linha 3-Vermelha possuem sensores de presença. Os terminais são: Corinthians-Itaquera, Artur Alvim, Guilhermina-Esperança, Patriarca, Vila Matilde, Penha, Carrão-Assaí, Belém, Bresser-Mooca, Pedro II, Palmeiras-Barra Funda. A Linha 1-Azul também conta com sensores e obstáculos em duas estações (Tucuruvi e Jabaquara).
Na Linha 2-Verde, barreiras físicas (preenchimento de vazios,vedações de borracha com estruturas de aço) foram instaladas recentemente nos quatro terminais que possuem portas (Vila Madalena, Sacomã, Tamanduateí e Vila Prudente). Na Linha 15-Prata, a Prefeitura explicou que as portas dos trens abrem para fora, portanto, não há espaço entre o trem e a porta da plataforma. A ViaMobilidade não possui sensores no espaço entre o trem e a porta do sistema, apenas nos trens. A empresa afirmou que possui sensores apenas nos trens para evitar colisões e que eles partem com as portas abertas.
“Nossa equipe de engenharia já está trabalhando nessa tarefa. E certamente teremos até fevereiro de 2026, então nos próximos meses, e atualmente a tendência é que busquemos dar continuidade a esse projeto, é a instalação de sensores de visibilidade nesses espaços, entre a porta do trem e a porta da plataforma. Com isso, qualquer objeto, qualquer pessoa, qualquer coisa que esteja presente, será identificado e a porta não fechará” — Francisco Pierrini, presidente da empresa, em entrevista à Band.
O espaço entre o trem e o sistema na cidade de São Paulo é maior do que em outros lugares do mundo?
Sim. O engenheiro Moacyr Duarte, especialista em análise de riscos e gerenciamento de emergências, afirma que esse tipo de acidente é quase impossível de ocorrer nos principais sistemas de metrô do planeta. Segundo ele, o motivo é que “não há espaço para uma pessoa no espaço entre a porta do trem e a porta de segurança”. Simplificando, o vão é quase inexistente.
Além disso, o engenheiro afirma que houve um problema no projeto original dos sistemas.
“Nos eventos que ocorreram aqui, indivíduos ficaram presos em uma área entre as portas.Foi uma falha no estudo de pesquisa anterior para aplicação. Quando se monta um sistema como este, é necessário aplicar uma série de estratégias e uma conferência de profissionais envolvidos para examinar as ameaças existentes.”
O que os especialistas dizem sobre a ausência de unidades de sensoriamento?
O engenheiro Luis Kolle, presidente da AEAMESP (Associação dos Engenheiros e Arquitetos Municipais), menciona problemas no projeto do sistema de segurança. Segundo ele, o sistema precisa ser criado para operar em modo “à prova de falhas”, ou seja, de forma a reduzir as ameaças quando ocorrem falhas.
“Ao projetar um sistema de segurança, é preciso prever o que pode acontecer com o sistema. Quando se trata de trens e trens, uma das coisas que acontecem com frequência é gente segurando a porta para entrar. Ao bloquear a porta, é preciso oferecer ao indivíduo a oportunidade de entrar no trem ou retornar ao sistema.”
Para o vice-presidente da Fenametro (Federação Nacional dos Metroviários), Alex Santana, os trens do Metrô têm muito mais recursos de segurança do que os trens da ViaMobilidade.
“Nas nossas linhas, há sensores de presença nos espaços, borrachas para impedir a permanência de pessoas, entre outras preocupações do sistema e procedimentos funcionais. No caso da L5 [ViaMobilidade], não há sensores de presença e as borrachas que existem não são suficientes. O vão quase não tem presença para monitoramento, e a ausência de trabalhadores nos sistemas acaba dificultando a prevenção dessa ocorrência”, afirma.
O projetista Peter Alouche, que trabalhou na Prefeitura de São Paulo por 35 anos, acredita que houve uma série de falhas no caso da morte de Lourivaldo.”A ausência do sensor faz com que a porta feche também com o indivíduo no vazio”, especifica.
Quais as opções sugeridas após o acidente? 4 de 4 Manifestação em frente à estação Campo Limpo, da Linha 5-Lilás, na tarde desta quarta-feira (7)– Imagem: Reprodução/TV Globo
Manifestação em frente ao terminal Campo Limpo, da Linha 5-Lilás, na tarde desta quarta-feira (7)– Foto: Reprodução/TV Globo
Segundo a ViaMobilidade, até o 2º semestre deste ano serão instaladas barreiras para cobrir o vão entre os trens e as portas das plataformas da Linha 5-Lilás.
Esse sistema já foi implementado na Linha 2-Verde após um incidente semelhante no terminal Vila Prudente em março, quando uma passageira também ficou presa nas ferragens, mas o trem parou e foi possível retirá-la sem ferimentos.
A concessionária também informou que instalará sensores nos vazios do sistema até fevereiro de 2026.