
O modelo atual documenta continuamente, mas se o STF autorizar o acordo, os militares poderão acionar os equipamentos para gravar apenas durante as operações e procedimentos. 1 de 4 O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) irá ao STF contra decisão liminar do padre Luís Roberto Barroso.– Foto: Montagem/g1/Carlos Moura/SCO-STF/Mônica Andrade/GESP
O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) irá ao STF contra decisão liminar do padre Luís Roberto Barroso.– Imagem: Montagem/g1/Carlos Moura/SCO-STF/Mônica Andrade/GESP
O governo de São Paulo e a Defensoria Pública fecharam um acordo nesta quarta-feira (7) para garantir que as câmeras dos uniformes dos militares sejam acionadas pelos próprios PMs e não registrem mais toda a movimentação, como ocorre atualmente. Para que o novo modelo seja utilizado, será necessária a autorização do Supremo Tribunal Federal (STF).
Isso porque, no ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) vinha analisando um pedido da Defensoria Pública, que, diante do aumento dos casos de violência policial, havia solicitado a manutenção do sistema de gravação ininterrupta das câmeras.
O acordo entre o governo e a Defensoria Pública foi fechado apenas na 3ª audiência de conciliação, mediada pelo STF, e durou cerca de 6 horas.
A TV Globo teve acesso aos termos do acordo.
Entre os principais pontos acertados estava que as novas câmeras corporais passariam a registrar as ações policiais quando acionadas por policiais da Polícia Militar.Eles certamente as terão em seus uniformes e as transformarão durante procedimentos oficiais ou paradas regulares.
Além disso, de acordo com o acordo, o Centro de Procedimentos das Autoridades das Forças Armadas (Copom) acionará as câmeras de outro local sempre que o policial estiver diretamente envolvido nas atividades da agência de segurança pública.
Atualmente, as câmeras de vídeo corporais utilizadas pelo policial são do modelo antigo, que funcionam continuamente durante todo o turno de trabalho, incluindo qualquer tipo de atividade. No entanto, de acordo com o acordo, elas certamente serão substituídas pelo novo modelo, acionado intencionalmente pelo policial e de outro local pelo Copom.
Assim, prevalece a vontade do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), que defende o modelo em que o policial militar pode decidir quando acionar a câmera eletrônica. Entre os debates do governo para acabar com a câmera de vídeo de uso contínuo está o de que ela invada a privacidade do policial em momentos específicos, como ao ir ao banheiro ou comer.
Organizações de direitos humanos, no entanto, desejavam manter a versão atual das câmeras, que são de uso contínuo.
Sua alegação é que, com o acionamento voluntário do MP, há um risco maior de irregularidades cometidas pelo agente. Entre elas: hostilidade, abuso e violência física das autoridades contra suspeitos de alguma atividade criminosa. E que o uso constante das câmeras funciona como uma forma de monitorar e até mesmo reduzir possíveis más condutas.
Outros pontos levantados são: aumentar o número de câmeras de 12.000 para 15.000 (saiba mais abaixo).
Reuniões anteriores entre o governo e a Defensoria Pública terminaram sem resultado. A ONG Conectas e a Plataforma JUSTA também participaram da reunião. No entanto, para que o acordo entre em vigor, ele precisará ser aprovado pelo Ministro Luís Roberto Barroso, do Superior Tribunal de Justiça.
Chamada para discutir o assunto, a Defensoria Pública informou que “aguarda a manifestação e autorização do STF para se manifestar”.
2 de 4 Governo Federal de SP testa novas câmeras corporais para a PM, em São José dos Campos– Foto: José Eymard/TV Vanguarda
Governo Federal de SP testa novas câmeras corporais para a PM, em São José dos Campos– Foto: José Eymard/TV Vanguarda
Em resumo, segue o que foi acordado entre a Defensoria Pública de São Paulo e a Procuradoria-Geral do Estado (PGE):
Ativação deliberada
O governo federal de São Paulo poderá iniciar a movimentação de câmeras de gravação ininterrupta para câmeras de gravação deliberada. Ou seja, pela PM em campo ou de outro local pelo Centro de Fluxo de Trabalho das Forças Armadas (Copom).
A Secretaria Geral de Segurança Pública (SSP) esclarece que todos os policiais serão treinados para responder a qualquer tipo de incidente ou reação e que o descumprimento das regras será devidamente apurado e punido.
Desde dezembro do ano passado, atendendo a um pedido da Defensoria Pública, o governo federal foi proibido, por decisão do Ministro Barroso, de iniciar procedimentos com câmeras de vídeo propositalmente acionadas.
Uso obrigatório em procedimentos e incursões em áreas de risco
Um dos fatores mais salvaguardados pela Defensoria Pública, o governo federal de São Paulo se comprometeu no acordo a usar as câmeras em todas as equipes que participam de procedimentos ou incursões policiais em locais vulneráveis.
Atividades que são realizadas para responder a agressões contra policiais militares também devem ter equipes com o equipamento em operação para todos os funcionários.
Considerando que em 2015, o governo foi obrigado por uma decisão do Padre Barroso a destinar as câmeras de vídeo para equipes em operações policiais de “grande porte” sempre que tivesse o equipamento.
Ênfase nos esquadrões com maior letalidade
O acordo também prevê que os batalhões com maior letalidade policial terão uso obrigatório de câmeras nos uniformes de seus agentes de segurança, como os Batalhões de Ações Policiais Especiais (BAEPs) e em cidades da Baixada Santista, por exemplo.
A pesquisa “Câmeras corporais na Polícia Militar do Estado de São Paulo”, elaborada pelo Fórum Brasileiro de Defesa Pública e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), revelou que houve um aumento nas fatalidades causadas pelas autoridades em esquadrões que utilizam câmeras corporais (+175,4%) e naqueles que não as utilizam (+129,5%).
Até então, o uso de câmeras corporais era restrito aos esquadrões selecionados pela SSP e não havia uma obrigatoriedade clara para procedimentos de maior risco.
Ativação pelo Copom
Todas as câmeras serão de outro local, ativadas pelo Centro de Procedimentos da Polícia Militar assim que as equipes iniciarem a atividade. Anteriormente,A proposta do governo federal era de acionamento remoto pelo Copom quando os grupos reportassem uma ocorrência ou serviço. Isso é considerado um ajuste significativo, pois evita o não acionamento em ações de risco. Antes do acordo, a projeção era de que o acionamento remoto pelo Copom só seria feito quando os grupos em situação de rua reportassem um caso à central. Desligamento difícil Se o policial acionar a câmera durante uma ocorrência e o sistema verificar que o equipamento foi desligado intencionalmente, a câmera será acionada imediatamente e a gravação retrocederá em 1 minuto, utilizando uma tecnologia chamada pré-buffering. Até então, a SSP trabalhava com a possibilidade de as novas câmeras serem desligadas pelos PMs quando estes reconhecessem que os casos haviam se encerrado.
Aumento na variedade de câmeras
O atual contrato firmado entre o governo de São Paulo e a Motorola previa a aquisição de 12 mil câmeras, 20% a mais do que a Polícia Militar possui atualmente no modelo de gravação contínua. No acordo, a PM pretende fazer um aditivo ao acordo e ampliar o contrato para operar 15 mil câmeras, o que representa 50% do efetivo que atua nas operações policiais.
Acesso às imagens das câmeras de vídeo
Com o acordo, o acesso da Defensoria Pública às imagens das câmeras corporais de forma extrajudicial é formalizado. Esta foi uma das principais reclamações da Defensoria Pública, que apontou dificuldades no acesso às imagens.
Planos de rastreamento e aprimoramento
Segundo o acordo,O governo federal de São Paulo empreende esforços para aprimorar as diretrizes de uso de câmeras eletrônicas e proporcionar maior transparência na circulação de informações relativas à legislação pública, além de aprimorar o sistema correcional e educacional das Forças Armadas, com base nas melhores práticas institucionais e no posicionamento com os conceitos da política de câmeras corporais.
Transparência e monitoramento
Ficou acordado que o governo de São Paulo enviará relatórios trimestrais ao Ministério Público (MP) e à Defensoria Pública com base em indicadores definidos em conjunto.
Além de publicar no site da Secretaria de Defesa Pública, juntamente com informações do Programa Muralha Paulista, informações de interesse público sobre o uso de câmeras corporais portáteis, incluindo as regras aplicáveis à ordem pública.
Demanda da Defensoria Pública
Câmeras corporais registram PMs torturando jovens na Zona Leste de SP
Caso o contrato seja homologado, o pedido que a Defensoria Pública fez ao STF para que o governo federal de São Paulo não altere o modelo atual das câmeras eletrônicas – que registram todo o turno do PM, ininterruptamente – deve ser arquivado.
Em dezembro, o Supremo Tribunal Federal determinou que o programa seja mantido até que se confirme que os novos equipamentos adquiridos garantirão o controle da atuação policial e a segurança da população durante as operações.
Em fevereiro, no entanto,a PGE do governo federal de São Paulo entrou com uma ação judicial mencionando que a decisão do Padre Barroso produziria um “valor extremo que inclui gravação e armazenamento ininterruptos de fotos em alta resolução” para o estado.
Segundo cálculos da PGE, em cinco anos, a gravação contínua certamente custaria ao estado R$ 766 milhões com as atuais 12 mil câmeras corporais, comprometendo o andamento da implementação de novos sistemas para os demais agentes da lei.
Em resposta, a Defensoria Pública sugere, em contra-argumentação firmada em conjunto com a Conectas Direitos Humanos e a Justa (Associação Plataformas – Ideias e Projetos para Soluções Públicas), que o recurso não deve ser confessado, afirmando que São Paulo tem um percentual acima da média nacional de mortes por tratamento policial em relação ao total de mortes por violência no país, e que a substituição do sistema de acionamento das câmeras corporais desconsidera a realidade concreta dos casos de letalidade policial.
O Ministério Público, que se apresenta como amicus curiae (parceiro da Corte) no caso, manifestou seu apoio ao novo modelo de câmeras corporais para as Forças Armadas. Autoridades – sejam elas acionadas intencionalmente por policiais militares nas ruas ou acionadas remotamente pelo Copom, desde que o governo federal envie um relatório da Polícia Militar sobre a viabilidade técnica e a eficácia funcional das novas câmeras.
Entidades e organizações também elaboraram uma carta aberta endereçada ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e estão acumulando marcas em defesa da priorização do uso de câmeras corporais na polícia para reduzir a violência.
Audiência de conciliação 3 de 4 Câmera corporal na farda de um policial militar do Estado de São Paulo.– Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Câmera corporal na farda de um policial das Forças Armadas do Estado de São Paulo.– Imagem: Rovena Rosa/Agência Brasil
A expectativa era de que o debate não se encerrasse na primeira reunião, por se tratar de um tema complexo. Entre as possíveis soluções para o caso estão um acordo entre as partes e autorização do apaziguamento, uma avaliação da decisão pelo Prefeito Barroso ou um pedido de decisão em plenário.
Enquanto isso, os Policiais Militares de São Paulo precisam utilizar as câmeras de vídeo em seus uniformes, que gravam continuamente, e seu uso é obrigatório em operações oficiais. Enquanto aguarda a decisão do STF, a Secretaria de Segurança Pública prorrogou os exames na cidade de São José dos Campos com as novas câmeras de vídeo, que não gravam todo o plantão e precisam ser acionadas de outro local pelos PMs ou pelo Centro de Operações.
Liminar de 4 de dezembro de 2014 O chefe de Estado do STF, Ministro Luis Roberto Barroso, e as câmeras eletrônicas usadas nos uniformes da Polícia Militar de SP.– Foto: Montagem/g1/Divulgação/STF/GESP
O chefe de Estado do STF, Padre Luis Roberto Barroso, e as câmeras usadas nos uniformes da Polícia Militar de SP.– Foto: Montagem/g1/Divulgação/STF/GESP
A decisão liminar de Barroso foi tomada no início de dezembro em meio a inúmeros casos de violência policial registrados em São Paulo nas últimas semanas (leia mais aqui).
Além de garantir o uso necessário dos equipamentos, Barroso também destacou:
a gravação ininterrupta das imagens nas operações até a comprovação da atuação do sistema de acionamento remoto (automático e deliberado); a estipulação de informações sobre processos disciplinares em andamento referentes ao descumprimento do uso de câmeras eletrônicas; a entrega mensal de relatórios pelo governo de São Paulo sobre os procedimentos estabelecidos; a restauração do efetivo de câmeras para que pelo menos 10.125 equipamentos funcionem.
Na decisão, Barroso destacou o aumento da letalidade policial em 2024.
“É fundamental a preservação do modelo atual de gravação ininterrupta, sob a acusação de violar a vedação constitucional de retrocesso e de não cumprir com o dever do Estado de resguardar os direitos fundamentais, em especial o direito à vida”, afirmou o ministro.
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