Resumo: Segundo o Censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população de Cidade Tiradentes é de 194.177 habitantes. É um dos bairros mais novos da cidade, com os primeiros loteamentos residenciais acessíveis inaugurados em 1986. Conheça um morador que representa a trajetória de vida e as lutas de quem vive na região.

Primeiro andar da casa da Vovó Luceli. A casa de baixo custo foi reformada e ampliada. Atualmente, são dois pavimentos. Foto: Arquivo pessoal.

Por trás da rotina de uma viúva de 71 anos, esconde-se uma grande história. Uma das pioneiras da Cidade Tiradentes, uma das favelas mais típicas da zona leste de São Paulo, Maria Luceli Barbosa Andrade, ou simplesmente Vovó Luceli, é um verdadeiro exemplo de resistência, fé, gentileza e espírito de bairro. Em sete décadas de luta, ela tem quatro filhos, sete netos, um casamento feliz e uma tradição de união que se expande com o projeto social Formiguinhas do Amor. Contar a história da Vovó Luceli é essencial não apenas por seu trabalho pioneiro em Cidade Tiradentes, nem apenas por suas incríveis experiências de vida, mas porque as histórias felizes dos bairros decadentes precisam ser registradas. Um ônibus no início da década de 1990, de uma empresa de transportes extinta que teve seu último ponto em Cidade Tiradentes, na Zona Leste. Foto: Recriada do Facebook. Nascida na região da Chapada Diamantina, na Bahia, Luceli cresceu em uma família numerosa: a caçula de dez irmãos por parte de mãe — seu pai, viúvo, tinha outros oito filhos com sua primeira esposa. Aos 15 anos, mudou-se para São Paulo, indo diretamente para a Freguesia do Ó. Aos 18 anos,Ela era casada com o baiano que conheceu no ônibus — coincidência ou destino. Eles chegaram à capital paulista no mesmo dia, em janeiro de 1981. Durante quase quatro anos, ela construiu sua história ao lado do companheiro: quatro filhos, uma mudança para a Brasilândia e, posteriormente, para o bairro Inácio Monteiro, em Cidade Tiradentes, onde mora há 33 anos, em uma casa de três andares que cresceu com o tempo — e com muito suor. “A gente nem sabia construir uma casa. Os pedreiros bebiam, deixavam o tecido espirrar, meu marido ia à casa deles todos os dias”, lembra. A casa da vó Luceli fica no bairro Inácio Monteiro. Com 3 andares, do topo é possível avistar o horizonte da Cidade Tiradentes ao longe. Foto: Arquivo pessoal. A casa foi a primeira a ser ampliada na região. Quando Luceli chegou à Cidade Tiradentes, em 1992, a região era praticamente um deserto: poucos ônibus, nenhum posto de saúde, lojas fechadas às segundas-feiras e um pedágio assustador na ponte que dava para o bairro Juscelino Kubitschek. “Os homens nos eliminaram mesmo. Viemos para cá sem entender nada”. Mas Luceli resistiu. Criou os filhos, viu os netos nascerem e ajudou a região a prosperar. Sua casa nunca alagou. “É no limite, a vista é deslumbrante”, orgulha-se. Ela tinha um mercado, o primeiro da região. “Fechamos porque eu estava sozinha. Tinha que sair de noite para fazer compras, voltava de madrugada, não dava mais para comprar

“. Com o tempo, a casa se tornou um lar para todos. Hoje, duas meninas e quatro netos cuidam dela. “Sou viúva, não tenho um companheiro para me sustentar”, diz ela com um sorriso travesso.”Minha outra metade foi realmente incrível.” Apesar de ter diabetes mellitus, sua rotina é difícil. Ela acorda às 5 da manhã para ir à academia, lava roupa, cozinha para os netos, entra para a equipe da igreja e ainda encontra tempo para um cochilo ao meio-dia. Voluntários do projeto social Formiguinhas do Amor preparando comida na garagem da vovó Luceli, em Cidade Tiradentes. Foto: Arquivo pessoal Formiguinhas do Amor, um projeto social que nasceu por oportunidade A história da vovó Luceli vai muito além das paredes de sua casa em Cidade Tiradentes. Após a morte do marido, no início da pandemia, ela decidiu transformar sua tristeza em ação. Foi aí que nasceu o projeto Formiguinhas do Amor, nome que descreve o método silencioso, simples, mas poderoso, com o qual ela ajuda dezenas de famílias. Em memória de sua outra metade — que doava cestas básicas todo fim de ano — ela acionou suas filhas, amigas e até a gerente do supermercado regional. Com apenas 100 reais e uma boa dose de fé, ela confeccionou cestas básicas com muita solidariedade. Um dos trabalhos pelos quais as Formiguinhas do Amor são homenageadas é a reforma da casa de uma mulher em Juquitiba (SP). Foto: Arquivo Pessoal. Não só comida: elas doam roupas, aparelhos de mobilidade, camas de hospital, adereços. Ela já reformou uma residência em Juquitiba, montou uma UTI domiciliar para uma criança e auxilia animais de rua. “Foi um trabalho pequeno, mas que se expandiu”. Luceli gosta de viver grandes jornadas. Aos 70 anos, decidiu realizar seu sonho

voando de balão. Foi para Boituva, no interior de São Paulo, cidade conhecida por promover o lazer aéreo. Ia ficar sozinha no balão, mas viu uma mulher saltando de paraquedas e decidiu

que era a vez dela. Ela saltou de 14,000 pés e desafiou também seus filhos a fazerem o mesmo. “Foi extremamente rápido. Quando vi, eu já estava lá embaixo.” Projeto Esporte Inclusão – Colorado Castro Alves foi auxiliado pelas Formiguinhas do Amor por meio de rifas para compra de uniformes. Foto: Arquivo Pessoal. Panelas organizadas com comidas diferentes da etiqueta. A vida da vovó Luceli é feita dessas pequenas e grandes viagens. Das estradas de terra, depois asfaltadas, depois com mais ônibus e facilidades na Cidade Tiradentes, ela foi para Roma, em uma viagem da igreja. Lá, ela comemorou, mesmo sem ver o Papa, que estava na África. São várias conexões e histórias, que representam o crescimento da família e as conquistas da favela, como a comunicação. Quando havia poucos celulares na Cidade Tiradentes, que não funcionavam bem, ela conseguiu seu primeiro telefone fixo. Os vizinhos os utilizavam e, quando as contas chegaram, “pagaram bem, nunca houve problema”, garante. Vovó Luceli, seu marido e filhos. Apesar de morar em uma guarnição do Corinthians, a família é majoritariamente torcedora do São Paulo. Foto: Arquivo pessoal. Mas, no entanto, será que a Vovó Luceli, radicada em Cidade Tiradentes, se mudaria de casa? “Eu adoraria me mudar para Arthur Alvim, no Carrão, mais perto do prédio, onde as meninas trabalham. Mas não vou vender esta casa por uma ninharia. Ela nunca está lotada. Há muita história aqui. “Vovó Luceli é uma mulher forte que decidiu espalhar amor como alguém que espalha comida nos vários potes do armário. O conteúdo, porém, não corresponde ao nome do produto, escrito lá fora. O feijão pode estar rotulado como açúcar.” É para enganar as formigas,”ela esclarece, e também joga a cabeça para trás rindo.

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