Mulher ficou internada por 15 dias em 2024 após agravamento de depressão. O caso ocorre após a morte de Eva de Oliveira, encontrada morta dentro de um banheiro de hospital por outra cliente. 1 de 1 Corredor do Hospital São Vicente de Paulo (HSVP), em Taguatinga.– Imagem: Agência Brasília/ Reprodução

Passagem do Centro Médico São Vicente de Paulo (HSVP), em Taguatinga.– Foto: Agência Brasília/ Reprodução

Uma pessoa que estava internada no Centro de Saúde São Vicente de Paulo (HSVP), em Taguatinga, no Distrito Federal, relata ter sofrido negligência médica e perseguição durante os 15 dias em que permaneceu internada no sistema, entre 4 e 19 de junho de 2024, devido à ansiedade.

Ela conta que foi amarrada e caiu no banheiro enquanto estava sozinha, precisando levar pontos na cabeça (saiba mais abaixo). A questão surge dias após a morte de Eva de Oliveira, encontrada morta dentro do banheiro de uma unidade de saúde por outra paciente, na última segunda-feira (22). Nesta sexta-feira (25), o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) deu prazo de 10 dias para que a Secretaria de Saúde do DF (SES-DF) discuta e apresente as providências que serão tomadas em relação às atuais ocorrências do HSVP. A Secretaria de Saúde do DF afirma que todos os internos do HSVP são acompanhados com exames e receitas médicas atualizados, de acordo com suas respectivas patologias e problemas médicos. No entanto, não se pronunciou sobre as alegações de negligência (confira a nota completa ao final da reportagem). O Distrito Federal conta com 83 leitos psiquiátricos em funcionamento no HSVP. No entanto, uma lei distrital publicada há quase 30 anos determina a conclusão desse tipo de leito em Brasília.

Desmaio e queda no banheiro

A mulher, que pediu para não ser identificada, relatou ao G1 que passou por situações semelhantes às de Eva. Durante a internação, a mulher desmaiou duas vezes.

A primeira aconteceu de madrugada, no banheiro. Assim como Eva, ela foi encontrada por outra cliente no início da manhã. A mulher afirma não saber quantas horas ficou inconsciente.

“Bati com a cabeça e fiz um corte profundo. O médico disse que conseguia ver minha cabeça. O problema é que não fui atendida no horário combinado. Só fui chamada para o hospital depois das 9h, quando minha família chegou para me visitar e eles não puderam me ver daquele jeito”, relata.

A paciente recebeu sete pontos na cabeça e passou por uma ressonância magnética no Hospital Regional de Taguatinga, com suspeita de traumatismo cranioencefálico. O exame não confirmou o ferimento, e ela foi levada de volta ao HSVP.

Amarrada à cama

Na noite seguinte, houve outro colapso. Depois disso, segundo a mulher, ela foi amarrada à cama pelos funcionários do hospital.

A mulher afirma que ficou amarrada por uma noite inteira, além de várias horas durante o dia, até ser liberada por ordem do médico.

“Eu estava amarrada, logo depois de desmaiar. Desmaiei duas vezes e, por isso, fiquei presa. Isso me deixou muito irritada. Eu reclamava, lembro-me de passar muitas horas amarrada. Uma noite inteira. Isso me deixou muito chateada”, afirma.

Para ela, as amarras eram uma espécie de “penalidade” para as pessoas.

“Vários amigos foram amarrados. Se você brigar ou discutir com alguém,Você está trancado. Isso é castigo. E nós estávamos lá ouvindo toda aquela gritaria. Eu estava pirando. Passei uma semana na ala ecológica, que é a ala mais horrível, é um inferno.”

Pedro Henrique Antunes da Costa, psicólogo e professor da Universidade de Brasília (UnB), comenta que esse tipo de restrição física geralmente não tem objetivo restaurativo e reforça a violência nos manicômios.

“Manicômios, centros de saúde psiquiátrica, não são instituições de cuidado. São instituições de violência física e mortificação. O que ela relata é a prova viva de tudo o que foi historicamente denunciado. A contenção, nesse contexto, parece uma punição, um controle e não um tratamento”, afirma a professora.

“Me deixaram em prisão solitária”

Segundo a pessoa, ela se internou voluntariamente, mas foi notificada de que poderia apenas pedir consentimento médico ou de familiares.

“Eu pedia para sair com frequência, e ninguém da minha família me autorizava a sair. “Me deixaram em confinamento solitário”, afirma.

De acordo com a legislação brasileira, existem três tipos de internação psiquiátrica: voluntária, involuntária e compulsória.

A internação compulsória é aquela determinada judicialmente, com base em prontuário médico que comprove a necessidade do procedimento. A internação voluntária, como foi o caso da pessoa entrevistada, ocorre quando o indivíduo aceita o tratamento e, por lei, pode solicitar alta a qualquer momento. A internação involuntária ocorre a pedido da família ou responsável, independentemente da autorização do indivíduo, mas só pode ser feita mediante apresentação de prontuário médico e comunicação ao Ministério Público em até 72 horas.

Outros casos no Hospital São Vicente de Paulo

Alana Magalhães pede explicações sobre a morte da tia.

Este não é o primeiro caso contra o Hospital São Vicente de Paulo. Em menos de 4 meses, 2 pacientes morreram no local.

Assim como Eva de Oliveira, em dezembro de 2023, Raquel Franca de Andrade, de 24 anos, também faleceu durante uma internação.

O velório de Eva ocorreu na manhã de quinta-feira (24), no cemitério Campo da Esperança, na Asa Sul. Durante a despedida, a família exigiu respostas sobre as condições da vítima fatal (veja o vídeo acima).

MPDFT pede explicações

O Ministério Público da Região e Territórios Federais (MPDFT) solicitou explicações à Divisão de Saúde do DF (SES-DF) sobre os últimos incidentes no Hospital São Vicente de Paulo (HSVP), incluindo os dois óbitos apontados neste boletim.

O auto, assinado por 3 promotores de justiça, explicita falhas estruturais no sistema:

Triagem clínica inadequada; Uso incorreto de contenção física; Acolhimento de pessoas com comorbidades incompatível com a estrutura da unidade médica; Precária situação de internação hospitalar.

O MPDFT alerta para as ameaças à segurança e à autoestima das pessoas em situações que apresentem falhas no processo de tratamento e na supervisão da conduta da equipe de saúde.

Entre as medidas necessárias estão a apresentação de um plano de ação com cronograma para ampliação do número de leitos psicológicos na rede, a construção de 15 novos Centros de Atenção Psicossocial (Caps) e a gratificação dos atendimentos realizados no Serviço Residencial Restaurativo (SRT).

O MP solicitou ainda informações atualizadas sobre as internações no HSVP e um histórico técnico sobre a eficácia dos métodos institucionais atuais.

O que a Secretaria de Saúde declara

“A Secretaria de Saúde comunica que o paciente E.O.S. faleceu no Centro de Saúde São Vicente de Paulo (HSVP) em 22/04/2025. O óbito foi comprovado pela equipe após manobras de reanimação, realizadas segundo o procedimento de Suporte Avançado de Vida, com a aplicação de todas as manobras e cuidados necessários pela equipe clínica e de enfermagem. A causa do óbito está sendo apurada.

Em relação à ocorrência anterior, R.A., todos os procedimentos adequados estão sendo realizados para garantir a devida responsabilidade.

Reforçamos que a Estratégia de Desmobilização de Leitos do HSVP já foi verificada junto aos órgãos de controle e segue conforme o cronograma previamente estabelecido. A execução das medidas segue em linha com a estratégia de expansão da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), garantindo a integração e a qualidade do atendimento prestado.

Atualmente, o HSVP está operando com 65% de ocupação de seus leitos. Considerando a capacidade total de 83 leitos disponíveis entre a Emergência e a enfermaria, isso representa aproximadamente 54 pacientes internados na unidade neste momento. Todos os pacientes internados no sistema estão sendo acompanhados com avaliações clínicas e prescrições atualizadas, de acordo com suas patologias e condições clínicas específicas.

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Os registros dos envolvidos no processo de fechamento dos manicômios judiciários

Saiba mais informações sobre a região no g1 DF.

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