
Um dos prédios mais importantes da história de São Paulo, o Quartel do 2º Batalhão de Guardas, no Parque Dom Pedro II, no centro da cidade, tornou-se um símbolo de abandono e deterioração nos últimos anos. Seus imponentes arcos, capela e pátio transformaram-se em um amontoado de escombros, com telhados e paredes arruinados à beira do colapso. A degradação se agravou
desde a pandemia, com o fechamento de comércios na região e o aumento de moradores de rua e usuários de drogas, que chegam a usar parte dos escombros do quartel como abrigo. O prédio centenário atualmente faz parte do Programa de Parcerias para Investimentos (PPI) para o Desenvolvimento Urbano e Imobiliário da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos). A Secretaria de Estado de Colaborações e Investimentos estuda a restauração do quartel e a construção de 1.231 unidades imobiliárias em seus arredores, como parte de um projeto mais amplo de requalificação do conjunto urbano, cujo destaque é a transferência da sede do governo federal estadual para a região de Campos Elíseos. A proposta em estudo para a área limítrofe ao Quartel do 2º Batalhão de Guardas é construir casas para famílias de baixa e média renda em ambas as extremidades do terreno, recuperando a área principal, onde o projeto se concentraria em dar nova vida a um local que, segundo a lenda, era originalmente uma fazenda dada de presente por Dom Pedro I à Dona Domitila de Castro Canto e Mello, a Marquesa de Santos, para que pudessem se reunir aparentemente nas noites em que o imperador dormia em São Paulo. Anos mais tarde, o imóvel residencial ou comercial foi ocupado pela Academia das Educandas e, em 1862,pelo Hospício de Alienados. O texto do edifício data de 1842, e as alas laterais, das últimas décadas do século XIX. No passado, o edifício tinha a curiosa característica de possuir simultaneamente linguagens colonial e neoclássica. O quartel do 2º Batalhão de Guardas está coberto de pátio alto e entulho; o pátio tornou-se um estacionamento para caminhões
encalhados. Imagem: Werther Santana/Estadão. Agora, o cenário é bem diferente. A degradação do prédio de dois andares, construído com taipa de pilão e alvenaria de tijolos, aparece de longe, da estação Dom Pedro II do Metrô ou da acessibilidade à Radial Leste. Da passarela que atravessa o Rio Tamanduateí, destacam-se antigas viaturas da Polícia Militar, galpões em ruínas, paredes com vazamentos e rachaduras, grama alta e pedaços de lona colocados no lugar das antigas venezianas de madeira, retiradas da fachada após apodrecerem pela ação do tempo. O Conselho Estadual de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Visitorístico (Condephaat) menciona que vem acompanhando as discussões referentes às propostas para o edifício. Por se tratar de um imóvel residencial ou comercial tombado, a obra precisa ser submetida à aprovação da empresa. “A remediação deve ser realizada com base em projeto arquitetônico elaborado por profissional especializado, considerando as características e exigências da estrutura”, afirma o Condephaat. Como o quartel também é tombado desde 1991 pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ecológico da Cidade (Conpresp), qualquer tipo de tratamento deve ser submetido ao órgão, que, no momento, não vê obstáculos para a remediação.”O Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) está à disposição do Governo do Estado para prestar assistência tecnológica nas ações de recuperação”, afirma em nota. Publicidade Leia também José Geraldo Simões Junior, professor do Instituto de Estilo e Urbanismo da Universidade Mackenzie, tem reservas quanto à proposta em estudo para reforma do quartel e desenvolvimento de 1.231 unidades habitacionais no entorno. “O quartel está em estado extremamente precário, com risco de desabamento, e necessita de tratamento imediato, porém o projeto prevê três torres residenciais gigantescas, com no mínimo 40 pavimentos cada”, afirma. “A questão dos imóveis populares não pode ser resolvida com estruturas desse tipo, pois a pós-ocupação é de difícil manejo. Atualmente, há um consenso de que os imóveis populares devem ser mais horizontais, com cinco pavimentos cada”, acrescenta. A decadência do quartel se agravou com a pandemia, com o fechamento de comércios no entorno; O prédio está abandonado, com janelas podres e paredes quebradas. Imagem: Werther Santana/Estadão Devido ao passado militar do prédio, um grupo de ex-militares lidera um movimento exigindo que o prédio seja restaurado e reformado. A explicação é que, em 1903, o local tornou-se o quartel da então Guarda Cívica. Em 1930, o prédio foi transferido para a antiga Força Pública, mas com o golpe militar de 1964, foi ocupado pelo Exército, primeiro como sede do 7º Corpo de Guardas e, posteriormente, do 2º Batalhão de Guardas (daí o nome pelo qual é conhecido até hoje). A partir de 1995, o prédio foi utilizado pelo 3º Batalhão da Polícia Militar, mas no início deste século, foi desocupado.Cloves Roque Xavier está entre os 22 mil reservistas que serviram no Quartel-General do Segundo Batalhão da Guarda entre as décadas de 1960 e 1990. Hoje, ele faz parte da equipe que aguarda a retomada do espaço há quase 20 anos. Ele já ouviu promessas de que o local seria transformado em galeria do governo e escola das Forças Armadas. Por isso, ele hesita em relação ao novo projeto. “A única coisa que garanto é que, se essa história se concretizar, estaremos prestando um serviço à história do Brasil e à região do Parque Dom Pedro, pois a região se tornará mais segura e melhor.”