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Quando chegou a São Paulo há 14 anos para trabalhar, o alagoano Claudevan da Silva Marques, de 32 anos, encontrou poucas opções de imóveis que pudesse administrar. Acabou se mudando para a favela do Moinho, a última do complexo da cidade. Sua companheira veio do Nordeste logo depois, e o casal teve duas filhas: uma de seis anos e a outra que fará dois. “Foi uma vida inteira lá”, conta o homem, que atualmente é motorista. O início da mudança foi marcado por estresse devido à presença de policiais da Polícia Militar, mas a situação foi finalmente resolvida após atendimento por policiais da CDHU. Foto: Taba Benedicto/Estadão PUBLICIDADE E MARKETING Na terça-feira, 22, a família foi uma das primeiras a deixar a favela, em meio a planos do governo federal de São Paulo para transformar a área em um parque. Os quatro estão agora em um lar temporário enquanto aguardam a chegada de um lar permanente. Segundo a administração estadual, 10 familiares deixaram o local – 11 realocações estavam planejadas para este primeiro dia. O início da remoção foi marcado por tensão no início da manhã devido à presença de policiais militares, mas a situação foi finalmente resolvida após mediação de representantes da Companhia de Habitação e Desenvolvimento Urbano (CDHU). Na última sexta-feira, dia 18, moradores montaram barricadas na área de acesso à comunidade após a entrada de agentes da PM. Na última sexta-feira, moradores montaram barricadas na área de acesso à comunidade após a entrada de agentes da PM.Foto: Taba Benedicto/Estadão A estatal afirma que está oferecendo uma variedade de opções imobiliárias para garantir que as mais de 800 famílias que vivem no local possam sair voluntariamente, com o apoio financeiro da moradia enquanto as obras não estiverem prontas. Moradores da região, no entanto, dizem que as propostas têm sido insuficientes, principalmente para as famílias que pretendem permanecer no centro – elas cresceram na Favela do Moinho há gerações e agora vivem lá. Eles também afirmam que a presença da polícia os tem sobrecarregado. A ideia inicial de Claudevan era conseguir algo temporário no local, onde o motorista trabalha e sua filha mais nova está em tratamento clínico, mas as opções não foram aceitáveis. “Saímos porque temíamos ficar sem nada”, disse ele ao Estadão. Esse tem sido um sentimento comum entre os moradores, diz ele. “Muitos estão com medo de serem deixados sem nada se demorarem muito para aceitar (alguma proposta).” O plano de ir direto para uma casa acabada também não saiu como o esperado. “Até gostamos de um empreendimento no Brás (zona leste), mas ele ia ficar pronto em dois anos”, afirma a dona de casa Bárbara Monique dos Santos, 28 anos, sócia de Claudevan. “E os outros empreendimentos prontos perto da prefeitura eram pequenos demais. Visitamos um na Penha (zona leste), que tinha 32 m², e éramos quatro. Não haveria espaço para nossas coisas.” O caminhoneiro Claudevan da Silva Marques retira seus pertences de sua casa na favela do Moinho, após um contrato com o governo federal. Foto: Taba Benedicto/Estadão Segundo ela, o casal teve pouco tempo para tomar a decisão.”Fomos numa quarta-feira e o profissional da CDHU disse que tínhamos até sexta-feira da mesma semana para escolher a casa”, conta. Ambos escolheram um apartamento de 50 m², em um prédio ainda em construção em Cachoerinha, na zona norte, com entrega prevista para 2026 e financiamento em trinta anos — o valor cobrado por instalação precisa ser inferior a 20% da renda familiar, atualmente em torno de R$ 3.000 para a família de Claudevan. Até lá, o casal utilizará o auxílio de R$ 800 pago pelo governo federal em parceria com a Prefeitura de São Paulo para morar em um apartamento temporário no Bom Retiro, no Centro. Como o aluguel é de R$ 1.700, eles complementarão o valor restante. “Escolhemos essa região especificamente por ser perto do centro de terapia da minha primeira filha na Santa Casa”, conta. A mulher precisou fazer uma traqueostomia quando ainda era bebê, o que significa que precisa ir ao posto de saúde regularmente. Ela também faz sessões de fonoaudiologia na Sé, no centro da cidade. Leia mais: “Confiamos só um jornalzinho”. A família relata que a vida era tranquila na favela do Moinho, mas que a situação começou a piorar há alguns anos, principalmente após a operação do Ministério Público Estadual que expôs que a região estava sendo utilizada como uma espécie de bunker pelo Primeiro Comando da Capital (PCC). Moradores relatam que a rotina passou a incluir o uso intenso de cães farejadores e buscas da Polícia Militar nas casas da região. Algumas famílias aprovaram as propostas por receio de que a vida no local piorasse. “Tínhamos muitas perguntas, mas o medo de não nos confiarem nada era maior”, afirma Bárbara.Mesmo após a decisão, ela e o companheiro permanecem indecisos, pois ainda não assinaram o contrato da nova casa em Cachoeirinha — a expectativa é que isso seja feito nesta terça-feira. Confiamos apenas a um pequeno bloco de notas que nos deram. Segundo a CDHU, 821 famílias moram na favela do Moinho; o local pertence à União. Foto: Taba Benedicto/Estadão. A imobiliária estadual afirma, em nota, que “todas as casas na favela foram cadastradas pela CDHU e também foram realizadas reuniões privadas para apresentar as opções imobiliárias disponíveis”. “A presença policial é para garantir o direito das famílias que optaram por deixar o local voluntariamente”, disse Marcelo Branco, Assistente de Desenvolvimento Urbano e Habitação, na terça-feira. No total, 821 famílias moram na comunidade, ou cerca de 2.500 pessoas. O governo federal informa que 719 famílias iniciaram o processo de vinculação voluntária (86% do total). Destas, 558 já estão aptas a autorizar os acordos e receber as chaves assim que as unidades estiverem prontas. Até o momento, 496 escolheram o imóvel para receber o auxílio final, o mesmo número que já iniciou o processo para receber o auxílio-moradia. “Foram prospectadas moradias adequadas para atender à demanda. Aqueles que desejarem também poderão ser alocados em unidades em outras regiões”, afirmou a CDHU, em nota. Segundo a empresa, foi feito um pedido público de obras na unidade ampliada. Inicialmente, foi oferecido um auxílio-moradia de R$ 2.400, além de um aporte imobiliário de R$ 800, segundo a CDHU. A empresa também afirma que todas as famílias serão atendidas dentro dos métodos disponíveis no portfólio da CDHU.Idealmente, por meio de Carta de Relatório de Crédito Associativo ou Carta de Pontuação de Crédito Pessoal. “O reassentamento das famílias da favela do Moinho é essencial devido à ameaça aos cidadãos, devido às instalações insalubres e à possibilidade de perigo em decorrência da construção e das ligações elétricas perigosas”, diz o documento. A CDHU afirma que, em todos os modelos fornecidos, a concessão de instalações corresponde a 20% da renda familiar, de acordo com as normas que regem o Plano Diretor Imobiliário de São Paulo. “Para quem recebe um salário mínimo, o auxílio estatal totaliza quase 70% do valor total da casa”, explica a empresa. Proposta de transferência de terras e parque Há mais de trinta anos, localizada sob o viaduto que liga as oportunidades Rudge e Rio Branco, próximo ao Terminal Júlio Prestes, a favela do Moinho está situada entre ferrovias, em uma área murada com apenas uma entrada e pouca possibilidade de drenagem de água. Na última década, dois grandes incêndios foram registrados, deixando centenas de mortos e desabrigados. Essas características impossibilitaram as diversas garantias dadas pela administração pública para regularizar a área ao longo dos anos. O governo federal Tarcísio de Freitas (Republicanos) pretende transformar a área em um parque, além de criar “um polo de crescimento metropolitano que será revitalizado para a implantação do Terminal Bom Retiro”. No entanto, a área é de responsabilidade do governo federal. Para viabilizar o projeto, o governo federal precisa aceitar a transferência do terreno para o Estado, em processo solicitado pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (SDUH). Em nota, o Ministério da Administração e Desenvolvimento Econômico (MGI), em conjunto com a Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPU),afirmou que mantém diálogo de longo prazo com o governo federal de São Paulo para encontrar uma solução para as mais de 800 famílias que vivem na favela do Moinho. A secretaria esclarece que as informações prestadas pelo governo Tarcísio são confusas. “O governo federal mantém as ações de realocação de domicílios que já possuem novo endereço, como as agendadas para esta terça-feira (22), desde que seja de livre vontade das famílias e sem intervenção policial”, afirma a secretaria. A SPU/MGI esclarece que o governo estadual solicitou a transferência da área para a implantação do Parque do Moinho, porém não há previsão para a transferência. O processo de transferência de terras passa pela garantia do direito à moradia para os familiares que ali residem e depende de alterações e melhorias por parte da CDHU/SP no plano de reassentamento, divulgado em abril deste ano. “A SPU também aguarda a divulgação dos detalhes do projeto a ser aplicado na região pelo governo de SP, para definição do instrumento orçamentário a ser utilizado. Somente após a publicação será possível dar continuidade aos trâmites administrativos para a formalização do contrato de transferência”, afirma. Em nota técnica enviada à administração estadual, a secretaria também esclarece que as dificuldades financeiras são inadequadas para o público-alvo, pois levantamento da própria CDHU apontou que 3,6% das famílias não têm renda e 25,5% têm renda inferior ao salário-base. Por isso, a secretaria solicita que o governo estadual considere ampliar o auxílio a esses grupos. O vice-governador de São Paulo, Felício Ramuth,Ramuth reagiu ao pedido em entrevista na terça-feira. “Se a SPU quiser contribuir, equiparando valores, aumentando o valor do aluguel social, porque a prefeitura está contribuindo com uma parte, o estado está contribuindo com uma parte… Se o governo federal quiser complementar, será muito bem-vindo”, afirmou. “Mas a proposta inicial está em vigor.” Ramuth acrescentou que a remoção, iniciada hoje, é resultado de um trabalho que já dura mais de um ano. “O governador Tarcísio fez esse pedido à CDHU, e hoje estamos iniciando um trabalho que certamente será replicado nos mesmos moldes nos próximos dias”, disse. O secretário de Publicidade, Marcelo Branco, também questionou os pontos a serem considerados pelo governo federal. “A União está satisfeita

com a localização oferecida a esta casa? Criando uma favela?”, questionou. “Se não estiver satisfeita com esta localização, não seria tranquilo sentar à mesa, conversar e chegar a uma conclusão?”/ ADICIONADO POR LÍVIA MACHADO

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