
O edifício da Cultura Inglesa, na Rua Deputado Lacerda Franco, foi incorporado em 1980 ao escritório do engenheiro modernista falecido em 1965. O projeto fazia parte do acervo de pesquisas da Faculdade de Design e Urbanismo da USP (FAU-USP). 1 de 7 O antigo prédio da Cultura Inglesa na Rua Deputado Lacerda Franco, em Pinheiros, Zona Oeste de SP, começou a ser demolido neste sábado (19).– Foto: Reprodução/Instagram
O antigo prédio da Cultura Inglesa na Rua Deputado Lacerda Franco, em Pinheiros, Zona Oeste de SP, começou a ser demolido neste sábado (19).– Foto: Reprodução/Instagram
A demolição do antigo prédio da Cultura Inglesa em Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo, neste sábado (19), gerou críticas e indignação de lideranças locais e da prefeitura em relação à conservação de prédios históricos durante a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) da capital paulista.
O prédio na Rua Deputado Lacerda Franco foi construído em 1980 pelo escritório do arquiteto modernista Rino Levi. O projeto fazia parte do acervo de pesquisas da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (FAU-USP).
A estrutura, que abrigava não apenas o curso de inglês, mas também sediava espetáculos de cinema e dança, oficinas e atividades sociais que marcaram a vida cultural da cidade, foi demolida pela construtora SKR, que pretende construir um condomínio residencial no local.
Rino Levi é um dos principais nomes do estilo paulistano e projetou diversos prédios históricos da cidade que hoje são tombados pelo patrimônio público.
Entre eles estão o Edifício Prudência, na Avenida Higienópolis,o Teatro Cultura Artística, na sede da prefeitura, e a estrutura da sede da FIESP, na Avenida Paulista.
Antes e depois do prédio demolido na Rua Deputado Lacerda Franco, em Pinheiros, Zona Oeste de São Paulo.– Imagem 1: Reprodução/GoogleStreetView– Imagem 2: Reprodução/
Após sua morte, em 1965, o local onde trabalhava e era companheiro continuou funcionando com suas atividades recorrentes.
O Movimento Pró-Pinheiros, desenvolvido por moradores da comunidade, afirmou em redes sociais que, apesar das mobilizações públicas, dos encantos da vizinhança e dos pedidos de diálogo, a demolição da estrutura na Lacerda Franco aconteceu de forma apressada e silenciosa.
Eles afirmam que se trata de um gesto que expõe “a ausência de atenção, nível de sensibilidade e valores citadinos” da construtora SKR e da gestão Nunes na proteção da memória da cidade.
“A cidade não pode continuar perdendo seus lugares em nome da renda instantânea. Ela vem de quem fica. Memória não é entulho. Até quando vamos perder nosso patrimônio? Quanto tempo as pessoas terão que ficar em vigília permanente para garantir o que vem de todos?”, escreveu. 2 de 7 A estrutura da Fiesp e o Teatro Cultura Artística projetados pelo arquiteto modernista Rino Levi em São Paulo,.– Foto: Reprodução/TV Globo
O prédio da Fiesp e o Teatro Cultura Artística projetados pelo arquiteto modernista Rino Levi em São Paulo,.– Imagem: Reprodução/TV Globo
“A Prefeitura, o Conpresp, o Condephaat não se importam com a memória, a história e a preservação dos lugares afetivos ou do design de assinatura na cidade”, mencionou entre as autoras da atividade, Rosanne Brancatelli.
Ela contou ao g1 que a equipe tentou entrar em contato com a construtora e a Prefeitura de SP — por meio de um representante da Subprefeitura de Pinheiros — antes da demolição, para entender o motivo da negociação com o prédio, mas ficou surpresa quando a estrutura foi demolida.
“Observamos aqui em Pinheiros que, sempre que abrimos a boca para pedir informações sobre o memorial na região, os pontos são aumentados para evitar qualquer tipo de discussão com os moradores. Foi assim com a Vila do Sol e com vários outros lugares onde os moradores tentam proteger a memória da cidade e são solenemente ignorados pelo Executivo, pela Justiça e pelas construtoras. Feito em nome do lucro”, comentou. 3 de 7 Mensagem enviada pelo Pró-Pinheiros à subprefeitura antes da demolição do prédio na Rua Deputado Lacerda Franco neste sábado (19).– Foto: Reprodução
Mensagem enviada pelo Pró-Pinheiros à subprefeitura antes da demolição do prédio na Rua Deputado Lacerda Franco neste sábado (19).– Foto: Reprodução
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Conpresp no alvo
O vereador e articulador municipal Nabil Bonduki (PT), professor da FAU-USP, também criticou a gestão Nunes pela demolição do prédio do Pinheiros e disse que o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico,O Patrimônio Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp) é “manipulado” por vereadores que não têm compromisso com a memória da cidade. “O Conpresp deveria ter previsto e aberto o processo de tombamento. Este órgão, que deveria ser responsável pela preservação do patrimônio social, arquitetônico e artístico da cidade de São Paulo, está sendo conivente com essa devastação”, afirmou. Bonduki menciona que há pelo menos três pessoas na atual composição do Conpresp que não deveriam estar na diretoria. Um deles é o vereador Rodrigo Goulart (PSD), que se afastou da Câmara Municipal para ser Secretário do Trabalho da gestão Ricardo Nunes (MDB), mas continua em seu cargo no Conpresp como representante da Câmara, apesar de estar afastado.
Quando vereador, Goulart foi relator na última legislatura da avaliação questionável do Plano Diretor Crítico (PDE) da cidade e do regulamento de zoneamento.
4 de 7 O vereador Nabil Bonduki (PT), o presidente da Câmara Ricardo Teixeira (União) e o atual auxiliar Rodrigo Goulart (PSD).– Foto: Montagem/g1/Rede Câmara
O vereador Nabil Bonduki (PT), o presidente da Câmara Ricardo Teixeira (União) e o atual auxiliar Rodrigo Goulart (PSD).– Imagem: Montagem/g1/Rede Câmara
Junto com ele, o atual chefe de Estado do Conpresp — o representante legal Ricardo Ferrari Nogueira — e seu substituto, Renan Marino Vieira, haviam sido indicados em 2023 para o cargo pelo prefeito nas funções atribuídas à Secretaria de Cultura dentro do colegiado, mas nenhum dos dois atua na pasta.
Ricardo Ferrari é nomeado para a Câmara Municipal de São Paulo como procurador,Enquanto Renan Marino é chefe de estado da ADE Sampa, a Empresa de Desenvolvimento Econômico de SP.
“A presença de Ricardo e Renan no Conpresp é claramente um erro grave, porém a lei, lamentavelmente, não diz expressamente onde eles devem atuar, mas sim que eles devem ser escolhidos pela Secretaria de Cultura. No caso de Goulart, é um escândalo. Ele é um assessor do prefeito que está substituindo um agente do Conselho, apenas uma cadeira de representação popular no conselho. Isso é irracional”, disse o parlamentar.
“O vereador dentro do Conpresp é o único que pode trazer a população para o seu gabinete, pode discutir com a cultura civil. Mas isso não está acontecendo. Atualmente, o prefeito tem cinco dos nove votos do Conpresp e qualquer tipo de esforço proeminente para proteger a cidade tem dificuldade em ser aprovado no conselho. Assim como as muitas deficiências que Goulart tem com as conferências, que estamos analisando”, disse o vereador.
O G1 entrou em contato com a diretoria Nunes e com o secretário Rodrigo Goulart para analisar o assunto, mas não obtivemos resposta até a última atualização desta reportagem. A equipe também está tentando falar com a construtora SKR.
Conflito político na Câmara 5 de 7 Sandra Tadeu (PL), Rubinho Nunes (União), Nabil Bonduki (PT), Paulo Frange (MDB) e Gabriel Abreu (Podemos): disputa pela vaga na Câmara Municipal no Conpresp. — Imagem: Montagem/g1/Reprodução/Rede Câmara
Sandra Tadeu (PL), Rubinho Nunes (União), Nabil Bonduki (PT), Paulo Frange (MDB) e Gabriel Abreu (Podemos): disputa pela vaga na Câmara Municipal no Conpresp.– Foto: Montagem/g1/Reprodução/Rede Câmara Nabil Bonduki é apenas um dos cinco vereadores da atual legislatura que pretendem ocupar a vaga na Câmara na comissão de preservação histórica. Ele foi escolhido por um conjunto de movimentos sociais, ex-assessores da sociedade e entidades de classe, em um abaixo-assinado com mais de 2 mil assinaturas, incluindo participantes do Movimento Pró-Pinheiros. No entanto, outros quatro nomes da base de apoio do prefeito — como Sandra Tadeu (PL), Paulo Frange (MDB), Gabriel Abreu (Podemos) e Rubinho Nunes (União Brasil) — também cogitam ocupar o local. Um parecer elaborado pela Procuradoria-Geral da República (órgão onde atua o atual chefe do CONPRESP) — a pedido do chefe do Tribunal de Justiça, Ricardo Teixeira (União Brasil) — afirma que manter Rodrigo Goulart na diretoria não infringe a lei.
“O fato de ele estar imediatamente afastado do cargo de vereador, por ser Assessor do Poder Executivo, não retira sua condição de vereador. (…) E a condição de vereador, aliás, é o único requisito para ser indicado a compor o CONPRESP, que, aliás, é eleito para um mandato de 03 anos”, diz o parecer.
O G1 apurou, junto a vários desses candidatos a vereador, que a manutenção de Goulart na diretoria foi a solução encontrada pelo chefe da Câmara para evitar brigas na base na disputa pelo cargo.
6 de 7 Publicação do coletivo Pró-Pinheiros sobre a demolição do prédio da Cultura Inglesa em SP.– Imagem: Reprodução/Instagram
Revista do Pró-Pinheiros acumula sobre a demolição do prédio da Cultura Inglesa em SP.– Imagem: Reprodução/Instagram
Entidades civis de cultura afirmam, no entanto, que entrarão em juízo para garantir a representação legal e fidedigna de todos os moradores do Conselho de Conservação da cidade.
A representante do Pró-Pinheiros, Rosanne Brancatelli, afirma que a cidade de São Paulo está “abandonada” do ponto de vista da memória e do direito à preservação histórica.
“A atual estrutura do Conpresp é composta por membros indicados pela prefeitura que não entendem absolutamente nada de conservação e patrimônio. Eles ignoraram três anos de trabalho do Departamento do Patrimônio Histórico, o DPH, que analisou diversos locais de Pinheiros que precisavam ser preservados. A cidade não pode continuar aprisionada pela indústria e pela arrecadação de obras”, afirmou.
“A demolição do prédio da Cultura Inglesa em Pinheiros é mais um exemplo que demonstra a falta de preocupação da atual administração em resguardar o que é fundamental para a cidade. Obras e adensamentos precisam ocorrer para modernizar a cidade e gerar empregos. Mas ainda em locais ou áreas que não têm valor simbólico ou arquitetônico para a cidade”, afirmou o vereador Nabil Bonduki.
7 de 7 Estrutura atual do Conpresp e seus representantes em São Paulo. — Imagem: Reprodução
Estrutura atual do Conpresp e seus representantes em São Paulo.– Foto: Recreação
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