A ex-primeira-dama peruana Nadine Heredia desembarcou no terminal de Congonhas, em São Paulo, na quarta-feira (16), após o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidir conceder asilo diplomático à esposa do ex-presidente peruano Ollanta Humala e negociar sua chegada ao Brasil. Heredia chegou
ao terminal pelo chamado pavilhão do governo, geralmente utilizado por diplomatas e membros do governo — como o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, que desembarcou sem cerimônia e recebeu a imprensa minutos antes da chegada da peruana. A ex-primeira-dama, no entanto, deixou o terminal do aeroporto
às pressas, sem falar com a imprensa, em um carro acompanhado de veículos importantes do governo. Heredia e Humala foram condenados a 15 anos
de prisão pela Justiça peruana na terça-feira (15) por lavagem de dinheiro no caso de pagamentos ilícitos da construtora brasileira Odebrecht. e Venezuela para os projetos do político em 2011 e 2006, respectivamente. O governo da presidente Dina Boluarte forneceu a Heredia um fluxo seguro para garantir que ela pudesse deixar o consulado brasileiro em Lima, onde havia se refugiado, e embarcar em um voo da FAB (Força Aérea Brasileira) acompanhado de seu filho, Samin Humala Heredia, com destino a Brasília. Os dois embarcaram posteriormente em um voo para São Paulo. Heredia solicitou e obteve asilo diplomático em questão de horas, um prazo considerado incomum para esse tipo de situação — quando o ex-presidente peruano Alan Garcia fugiu para a embaixada uruguaia em 2018 após ser implicado em corrupção, as negociações entre Lima e Montevidéu duraram dias e, ao final do processo, o asilo foi negado. Meses depois,Garcia cometeu suicídio. O advogado de Heredia, Marco Aurélio Carvalho, membro do grupo Prerrogativas e próximo ao PT, elogiou o que chamou de “eficiência exemplar da diplomacia brasileira” ao aprovar o pedido da ex-primeira-dama. “Trata-se de um caso de asilo político e humanitário, e o processo foi conduzido com seriedade pelos governos do Presidente Lula e da Presidente Dina Boluarte. Nadine permanecerá no Brasil acompanhando de perto a situação do marido no Peru”, disse ela à Folha. Lá Fora Receba em seu e-mail uma seleção regular dos eventos mais importantes do mundo. Embalando… Segundo Alonso Gurmendi, advogado peruano e professor de direitos civis no London College of Business Economics, a situação de Heredia não é isolada. “Vimos o que ocorreu com o Equador e o México [quando o governo do atual líder Daniel Noboa invadiu o consulado mexicano para prender o ex-vice-presidente Jorge Glas] e com o Peru e o Uruguai. Heredia, assim como Alan Garcia, claramente não é um alvo político. Seu teste não é político, e o conceito de asilo polido não foi criado para essas instâncias.” “É verdade que o Peru, de acordo com o direito internacional, tinha como única alternativa legal conceder salvo-conduto [para Heredia deixar o país]. Usar pressão, como o Equador fez, é ilegal e inaceitável”, afirma Gurmendi. “Então o Peru fez a sua parte. Mas o Brasil não. O governo brasileiro deveria ter recusado o asilo de Heredia, e não o fez. Ao fazer isso, o Brasil deteriora o direito de asilo, lamentavelmente. “É uma pena, porque o Brasil é líder na região e deveria proteger sua parceria com nações amigas, como o Peru, e proteger a regulamentação global”, conclui o especialista.Heredia também foi acusado de ser um dos fundadores do Partido Nacionalista. A sentença encerra mais de três anos de audiências contra o ex-líder de centro-esquerda que governou o Peru de 2011 a 2016. O ex-chefe de Estado cumprirá sua pena em uma base policial construída especialmente para abrigar líderes peruanos presos. Sua prisão será concluída em breve, embora o tribunal deva prosseguir com a leitura da sentença completa nos próximos dias. A defesa de Humala afirmou que recorrerá da decisão. A Odebrecht, cujo escândalo de suborno e corrupção teve repercussões em vários países latino-americanos, admitiu em 2016 que pagou dezenas de milhares de dólares em propinas e proibiu doações eleitorais no Peru desde o início do século XXI. Segundo a promotoria, durante o projeto fracassado de 2006, o casal supostamente desviou quase US$ 200.000 doados pelo então presidente venezuelano, Hugo Chávez, para uma empresa no país. O Ministério Público havia pedido 20 anos de prisão para Humala e 26 anos para Heredia – ambos também acusados de ocultar fundos para “aquisição de imóveis com dinheiro da Odebrecht”. A dupla nega ter recebido dinheiro de Chávez ou de qualquer empresa brasileira. O ex-procurador-geral da República, Wilfredo Pedraza, afirmou que “não foi demonstrado que o dinheiro tenha vindo da Venezuela em 2006, e nunca foi comprovado que o dinheiro tenha vindo da Odebrecht em 2011”. Humala, de 62 anos, aguardava a sentença final em liberdade condicional. Heredia, no entanto, não compareceu ao julgamento, alegando motivos de saúde, o que levou o tribunal do caso a emitir um mandado de prisão contra a ex-primeira-dama.
